O deveras pesado sono de João
Augusto da Silva é interrompido por uma voz amiga. Sua mãe, entre cozinhar e passar
e limpar a mesa da cozinha, grita “Acorda pra se arrumar! Senão vai se atrasar
pra escola!”. Numa sonolência cambaleante, João se dirige ao banheiro , afinal,
são 5 da manhã. Na correria, João precisa engolir o café, fazer alguns minutos
de caminhada, e pegar um ônibus de uma hora e meia de trajeto para estar na
escola às 7h30 em ponto. Ao chegar, João encontra Antônio e José, e juntos eles
passam o dia em meio à estridentes horas de língua portuguesa, matemática e
gritos de “Silêncio turma!”.
Erik
Johansson, mesma idade de João, acorda calmamente ouvindo a voz de sua mãe que calmamente
prepara a refeição. Após o banho, Erik encontra seu pai e sua mãe à mesa para
um longo e calmo café da manhã. Erik e sua mãe saem de bicicleta num bem
arborizado trajeto de 25 minutos para chegar no horário. Ao chegar na escola, Erik encontra Astrid e
Petri, e juntos navegam tranquilamente por aulas de língua sueca, língua
inglesa, matemática, história, música e educação física.
É
bastante óbvio que a probabilidade do sueco Erik possuir um futuro econômico mais
próspero que o brazuca João é bastante alta, e a diferença de qualidade entre
as escolas tem um importante papel. Eu sei, eu sei. Assim como nas duas
histórias, existem muitos fatores além do investimento em educação que afetariam
o resultado final (afinal, a Suécia é um país muito mais rico, com população
mais homogênea, extensão geográfica muito menor, infraestrutura sofisticada, etc),
no entanto, a tamanho do impacto pode variar, mas não a direção.
Sabemos
que mesmo no Brasil, não são todas as escolas que caem aos pedaços, mas de
forma geral, elas têm algo em comum: a baixa qualidade do serviço. Engana-se
quem acha que o que falta é investimento. O Brasil gasta por estudante mais do
que outros BRICS (para comparar maçãs com maçãs). O que faz então o ensino ter
qualidade subótima? A forma de usar o dinheiro investido. O repasse direto às
escolas visa garantir a educação “gratuita” à uma parcela da população, mas
como é sabido, os resultados não são dos melhores.
A
educação na Suécia também é “gratuita”, mas a forma com que os recursos são
alocados é ligeiramente diferente do que na terra da jabuticaba. Mais próximo
ao polo norte, as famílias recebem um voucher de educação que garante ao
estudante a possibilidade de matrícula em qualquer escola do país, seja ela
pública, privada, ou um misto dos dois. Uma diferença sutil capaz de gerar
impactos bem distintos.
O
voucher atinge bons resultados de duas formas: a primeira é que ele ajuda a
reduzir a barreira financeira do acesso à boas escolas (apesar de não acabar
com ela, já que a condição financeira está associada a morar em áreas melhores,
que geram benefícios associados); a segunda é que para receber, as escolas
teriam que competir em qualidade de ensino e, ao mesmo tempo, precisariam
sinalizar para as pessoas que a sua escola é a melhor para João, ou seja,
precisariam ter os melhores professores, forneceriam melhores estruturas; terceiro,
facilitaria o surgimento de novas escolas em regiões desprovidas, uma vez que
isso se tornaria uma opção de renda para um conjunto de moradores.
Detalhes,
dizem que é a residencia do Diabo, tanto do Diabo personificado quanto do diabo
abstrato. Detalhes importam, e muito, cabe a nós importar o que bom.
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